Paraguai: a união não deixa moverem montanhas

Entre o saldo da exploração estrangeira e as garras dos projetos governamentais, o Chaco paraguaio tem seus defensores

“Diria que a principal causa da degradação ambiental no Paraguai é a concentração de terras na mão de poucas famílias”, afirma Rodrigo Arias, membro da Asociación Defensores del Chaco Pypore, grupo de pessoas que lutam pela preservação do bioma localizado em toda a porção ocidental do país, ultrapassando a fronteira com a Bolívia ao norte e com a Argentina ao sul.


A concentração fundiária não é apenas a causa da destruição ambiental, senão a consequência de um episódio histórico — a Guerra do Paraguai, em que Brasil, Argentina e Uruguai dizimaram cerca de 75% da população paraguaia, de acordo com o livro do jornalista Julio José Chiavenato Genocídio americano: a guerra do Paraguai (1979).


Oito anos antes, o escritor uruguaio Eduardo Galeano, em As Veias Abertas da América Latina (1971), expôs os processos de empobrecimento do país como consequência direta do conflito: “O Paraguai é também colônia de colônias. Usando a reforma agrária como pretexto, o governo de Stroessner, fazendo-se de distraído, derrogou a disposição legal que proibia a venda a estrangeiros de terras das zonas de fronteira seca, e hoje até os territórios fiscais caíram nas mãos de latifundiários brasileiros do café”.


Essa realidade não só persiste, como se aprofundou. Em 2008, apenas os brasileiros controlavam 25% de todas as propriedades com mais de 1.000 hectares no país, enquanto em 1991 o número era de 14%. É o que a pesquisadora Lorena Iza Pereira mostra no artigo Ciclos de estrangeirização e concentração da terra no Paraguai, publicado na Revista NERA da Universidade Estadual Paulista (Unesp).


O contexto de aumento da concentração fundiária na mão de brasileiros está principalmente ligado ao avanço da monocultura de soja, que se expande em direção ao Chaco. Além do clima favorável, uma das razões é o preço da terra ser mais baixo. Como na expansão agropecuária para a Amazônia, o movimento para o Chaco é marcado pelo processo de desmatamento.

Não, não toque

O Gran Chaco se divide em úmido e seco. A porção mais próxima à Bolívia é conhecida como Chaco Seco e se trata de um bioma frágil. “A menor disponibilidade de água faz com que a vegetação demore mais para se desenvolver completamente. São altas temperaturas, pouca água e pouca disponibilidade de matéria orgânica no solo. Após uma alteração, é mais difícil de recuperar o ecossistema chaquenho porque leva mais tempo para reunir as condições de umidade e nutrientes”, explica Arias.


Embora a soja avance sobre a área, essa não é a única ameaça ao território. Em 2015, o governo paraguaio propôs uma prospecção que retiraria rochas do maciço de Cerro León, localizado dentro do Parque Nacional Defensores del Chaco, no Departamento de Alto Paraguay, para pavimentar estradas. A medida resultou em mobilização popular para barrar a proposta, que culminou no ano seguinte na formação da Asociación Defensores del Chaco Pypore.


Com 40 quilômetros de diâmetro e 600 metros de altura em relação ao nível do mar, Cerro León tem uma construção geológica de rochas sedimentares e os processos pelos quais passou lhe deram características únicas, como a formação de um aquífero em uma região de semiárido onde não há outros nas proximidades.


A exploração das colinas não só teria potencial para contaminar e exaurir o aquífero, como também impactaria a existência das espécies silvestres que vivem dentro do Parque — como os diversos grupos de felinos — e afetaria as comunidades indígenas que vivem em isolamento voluntário na região.


A indignação popular se desdobrou na campanha “Cerro León no se toca”. Após a vitória contra o projeto do governo, surge a associação para continuar a luta pela preservação local. “Desde então, a organização atua ativamente nos temas relacionados a áreas protegidas e ao apoio aos guarda-parques. Hoje nossos eixos principais são as mudanças climáticas, água e saneamento e biodiversidade.” Em relação à crise climática, Arias afirma que os Defensores del Chaco buscam atuar na educação ambiental e na capacitação de pessoas mais jovens, além de manterem grupos abertos de informação nas redes sociais e compartilharem notícias e pesquisas entre a comunidade.


Para ele, é essa união e rede de apoio que tornam a defesa do planeta possível: “Existem várias pessoas apaixonadas pela causa, pelo meio ambiente e por poder estar com a natureza. O fato de se conectar com elas é um incentivo. Assim, podemos nos mobilizar, fazer com que nossa voz seja ouvida e gerar a proteção de uma terra que já foi muito agredida. Nunca estamos sozinhos para proteger o meio ambiente e nossa própria vida”.